Os Estados Unidos à beira de uma nova Grande Depressão?
Relembrando a Espiral de Kindelberger: lições que o tempo insiste em ignorar
O cenário econômico mundial dá sinais de tensão. A sombra da crise se alonga novamente sobre os Estados Unidos, e o alerta vem de um velho conhecido da história: a espiral de Kindelberger. Para quem não conhece, Charles Kindleberger foi um renomado economista americano que estudou a fundo as causas e desdobramentos da Grande Depressão de 1929.
Entre suas conclusões mais impactantes está a ideia de que não foi apenas o colapso da Bolsa de Valores que destruiu a economia americana na época — mas as medidas desesperadas tomadas pelo governo para tentar contornar a crise. E aí é que mora o perigo atual: será que os EUA estão repetindo os mesmos erros de 1929?
A crise de 1929 não precisava durar tanto
A economia tem seus ciclos, e crises fazem parte do jogo capitalista. Mas, segundo Kindleberger, o grande erro foi a intervenção estatal desastrada. Quando o governo americano resolveu aumentar as tarifas de importação para “proteger” suas empresas e estimular a indústria local, o resultado foi catastrófico.
Essa ação deu início à chamada espiral de Kindelberger — uma queda livre no comércio internacional, causada pelo efeito dominó de políticas protecionistas adotadas por vários países em resposta às tarifas americanas.
A história se repete… como tragédia?
Hoje, o cenário começa a mostrar paralelos inquietantes. Propostas protecionistas voltam à tona, com líderes políticos defendendo tarifas de importação altíssimas para “repatriar empregos” e estimular a indústria nacional.
É um discurso sedutor, especialmente em tempos de incerteza. Mas, como já vimos em 1930 com o Smoot-Hawley Tariff Act, esse tipo de ação tem um custo alto: a quebra do comércio global, a retaliação de outros países, e a queda na competitividade até mesmo das empresas que se pretendia proteger.
A interdependência é a regra — não a exceção
Vivemos num mundo interligado. Não existe mais essa ideia de “autossuficiência econômica” de um único país. Até uma simples batata no mercado depende de uma cadeia global que envolve máquinas importadas, fertilizantes, embalagens e transporte internacional.
Fechar fronteiras comerciais e elevar tarifas parece simples na teoria, mas é uma armadilha. Quando você impede o produto estrangeiro de entrar, você também está encarecendo a sua própria produção, já que a indústria local depende de insumos vindos de fora.
O protecionismo beneficia poucos e prejudica muitos
A lógica é sempre a mesma: prejudicar o consumidor e o trabalhador em nome de proteger o grande empresário. As tarifas deixam produtos mais caros, sufocam a concorrência e reduzem a eficiência. Ajuda meia dúzia e prejudica milhões.
E pior: não cria empregos reais, pois a indústria americana dificilmente conseguirá competir com o custo de produção de países como China ou Vietnã — onde o padrão de vida e os salários são proporcionais à realidade local.
Estamos assistindo a uma nova espiral de Kindelberger?
As semelhanças assustam. Assim como em 1930, vemos um movimento político buscando salvar a economia pela via do protecionismo, com justificativas nacionalistas e promessas de retomada industrial. Mas a história já mostrou aonde isso leva.
Em 1929, os Estados Unidos estavam afundados numa crise, tentando se reerguer. Agora, a situação ainda é estável — mas a repetição dos erros pode precipitar uma nova Grande Depressão, antes mesmo que ela seja inevitável.
A saída não é isolar-se — é cooperar
Se existe algo que a espiral de Kindelberger nos ensinou, é que reduzir o comércio global é como cortar o próprio oxigênio em tempos de sufoco. A prosperidade não vem do isolamento, mas da troca, da colaboração, da eficiência conjunta.
A economia global depende do fluxo constante de bens, serviços, conhecimento e inovação. E romper essas conexões em nome de um falso patriotismo econômico é como dar um tiro no próprio pé.
Considerações finais: o futuro depende de aprender com o passado
Os Estados Unidos ainda são uma das economias mais poderosas do planeta. Mas poder não é imunidade. E a arrogância de pensar que um país pode crescer sozinho pode ser o primeiro passo rumo à próxima tragédia.
Se a história se repete, que não seja por ignorância — mas como um aviso para que possamos quebrar a espiral antes que ela comece.